Visitas de professores fazem com que alunos e pais sintam-se em casa (Boston - EUA)

Por James Vaznis

A menina já estava de pijama quando os seus professores do jardim de infância chegaram em uma noite límpida, neste mês, trazendo presentes: um livro de colorir, um quadro para escrever e uma sacola cheia de ímãs revestidos de plástico com formato de letras do alfabeto.

Mas Megan Coyne, de três anos de idade, não sentiu-se tentada pelos presentes. Tomada de uma timidez súbita, ainda que passasse seis horas por dia com as professoras, a garota ficou no vestíbulo, atrás da mãe, com os braços apertados em torno das pernas desta. "O seu pijama está cheio de desenhos de sapos", disse com um sorriso tranquilizador a sua professora, Pam Richardson, da Escola Piloto da Academia Lee, no bairro de Dorchester, em Boston. "Megan não comeu muito no almoço. Ela estava com fome quando veio para casa?".

Richardson faz parte do grupo de dezenas de professores da escola primária e secundária de Boston e Springfield que estão visitando as famílias dos alunos neste ano, com o objetivo de encorajar a participação voluntária dos pais nas reuniões da escola e o envolvimento com a educação das crianças em casa, bem como de acabar com qualquer concepção errônea que pais e professores possam ter uns em relação aos outros.

A prefeitura de Boston, que está trabalhando em parceria com a Universidade Harvard, deu início ao seu programa dois anos atrás e o expandiu para cinco escolas de ensino fundamental. A iniciativa surgiu após o exemplo de Springfield, que há cerca de cinco anos criou - como parceria entre o sindicato municipal dos professores, uma escola de segundo grau e o Projeto Vale Pioneiro - um grupo de organização de comunidades que trabalha em contato próximo com os pais.

O programa encontra-se atualmente ativo em sete escolas, incluindo uma de segundo grau. O alcance do programa - que neste ano chegou a várias centenas de famílias - faz parte de uma estratégia nessas duas cidades para reverter uma tendência de redução da participação dos pais.

Em ambos os distritos, os pais raramente aparecem nas reuniões da organização de pais e alunos, conferências de professores e outras atividades em várias escolas. Em alguns casos, eles estão ocupados demais, trabalhando em vários empregos, não têm transporte para ir até à escola ou sentem-se intimidados para falar com os professores devido à baixa instrução ou a uma experiência ruim pela qual passaram quando eram alunos.

Em Boston, muitos pais que cresceram durante o período tumultuado do "forced busing" (política que obrigava crianças de um determinado bairro a matricularem-se em escolas de outra região para que se atingisse um "equilíbrio racial" nessas instituições) mantêm-se distantes das escolas por terem ressentimento, ou até mesmo desconfiança, em relação ao sistema.

As visitas são também elaboradas de forma a esclarecer os professores - muitos dos quais moram fora das cidades e podem ter falsas impressões sobre os bairros nos quais os alunos moram -, possibilitando que observem os estilos de vida que as crianças têm em suas casas.

Os professores de Boston recebem US$ 60 (R$ 104) por visita, e os de Springfield aproximadamente US$ 30 (R$ 52). "Essas visitas eliminam o ciclo de desconfiança que ocorre entre os educadores e as famílias", afirma Linnette Camacho, coordenadora de educação familiar das escolas de Springfield. Embora nenhuma das duas cidades tenha realizado um estudo formal sobre a eficácia do programa, os organizadores afirmam que professores e diretores observaram que houve um aumento da participação dos pais nas escolas e que as notas dos alunos também têm aumentado.

As autoridades escolares de Springfield sentem-se tão encorajadas que estão criando uma proposta de expansão do programa para outras escolas municipais. Algo que ajudou essa iniciativa foi a criação da Associação Nacional de Educação, o poderoso grupo sindical de professores de âmbito nacional, que forneceu ao distrito uma verba para planejamento de US$ 50 mil (R$ 86 mil) - o primeiro passo para o fornecimento de US$ 1,25 milhão (R$ 2,2 milhões) para a expansão do projeto.

"Os professores percebem que o envolvimento dos pais é fundamental para melhorar o desempenho dos alunos", diz Tim Collins, presidente da Associação Educacional de Springfield. "Creio que há muitos dados que demonstram que quando os pais estão engajados, os alunos têm mais sucesso na escola". Boston e Springfield basearam seus programas em um outro que teve início há mais de uma década em Sacramento, e que elevou os índices de presença e as notas dos alunos, reduzindo, ao mesmo tempo, as suspensões e os casos de vandalismo escolar.

Em Boston, o programa faz parte de uma iniciativa mais ampla chamada Three-to-Third, uma colaboração entre a prefeitura, o Departamento Escolar e a Escola de Pós-Graduação em Educação da Universidade Harvard para conseguir fazer com que todos os alunos estejam lendo e compreendendo textos até o final da terceira série. A Universidade Harvard está oferecendo treinamento para as visitas domiciliares e organizou grupos e pesquisas sobre o programa.

A universidade está prestes a dar início a um estudo mais amplo dos resultados do programa. Geralmente os professores introduzem a ideia de uma visita enviando aos pais uma carta que dá a estes uma mensagem de boas-vindas à escola. Alguns telefonam para os pais, em vez de enviar-lhes uma carta. Mas eles não batem à porta de nenhuma família sem avisar.

A família Coynes foi pega meio de surpresa ao receber um convite antes do início do ano escolar feito pela futura professora da sua outra filha, Mackenzie, que é gêmea de Megan. "No início eu fiquei meio cético", diz David Coyne, que atendeu o telefonema. "Parecia que se tratava de algo do tipo 'Grande Irmão' - o governo - investigando para ver se éramos bons pais".

Mas segundo ele a visita correu bem. A professora jamais se comportou como inspetora de bem-estar infantil. Ela não caminhou pela casa com um caderno na mão, rabiscando observações durante o percurso. Na verdade os professores são instruídos a deixarem cadernos de anotações no carro.

Em vez disso, professores e pais simplesmente conversam, e frequentemente pergunta-se aos pais que esperanças e sonhos eles têm em relação aos filhos. Assim, quando Richardson chegou algumas semanas mais tarde com a sua assistente, Misheka Barrosy, os Coyne sentiram-se como profissionais. Eles encomendaram pizzas e todos sentaram-se à mesa da cozinha, conversando sobre como estava sendo o ano escolar.

Os Coyne tiveram um começo meio conturbado na escola. Inicialmente, apenas a matrícula da filha Mackenzie foi aceita, o que obrigou Megan a retornar a um jardim de infância particular que os pais acreditavam que contava com um programa de qualidade inferior. Foi difícil para Kellyann Coyne ver as gêmeas separadas com tão pouca idade durante as primeiras semanas de escola. E Megan continuou vindo da escola particular para casa com os mesmos projetos de casa que as gêmeas haviam feito um ano antes.

Os Coyne ficaram tão frustrados que chamaram relutantemente um corretor de imóveis para visitar a casa no mês passado, já que estavam pensando em mudarem-se para os subúrbios da cidade. No entanto, uma hora depois, a Academia Lee telefonou avisando que havia uma vaga na turma de Richardson.

O número de Megan finalmente fora contemplado na lista de espera, nove meses após ela ter sido inscrita. "Boston conta com o melhor programa educacional para crianças pequenas", explica Kellyann Coyne, tendo à sua frente, do outro lado da mesa, as duas professoras. "Eu sabia que as garotas apresentariam bastante desenvolvimento nessa escola... Estou entusiasmada com o progresso delas".

Após conversarem durante mais de uma hora à mesa, os Coyne mostraram a casa de dois andares às professoras. Aproximadamente às 20h45, cerca de duas horas e 15 minutos após terem chegado - as professoras decidiram ir embora. A mãe caminhou até a frente da casa com elas, e o papo continuou.

Tradução: UOL

Edição: Prof. Christian Messias | Fonte: The Boston Globe, 23/10/2009

2 BRASILEIROS:

Elis disse...

O casamento entre pais e a escola e perfeito e nao ha como nao render bons frutos,ne?

Cristiane A. Fetter disse...

Elis, eu também acho. Eu sei que no Brasil as escolas particulares tem um trabalho parecido, mas nunca ví nada como acontece nos Estados Unidos.
bjks