Conheça Hutt River, uma 'micronacao' na Australia

Depois de um longo e luminoso período de férias e muita, mas muita neve, estou de volta, não completamente como gostaria, mas como é possível e para esta volta segue artigo que saiu do G1 Portal de Notícias.
 É bom estar de volta.

"Algumas pessoas pensam que Hutt River é um país jovem, novo, mas recebo muitos turistas alemães aqui e tenho orgulho de dizer a eles que Hutt River não é um país jovem e novo."
"É um país bem antigo. A Alemanha acaba de comemorar seu 20º aniversário", disse Leonard Casley, referindo-se à Alemanha unificada, de pé ao lado de um busto de si mesmo - o braço direito sobre a réplica da sua própria coroa. "Celebramos nosso 40º ano."
Leonard Casley ao lado de seu próprio busto em Hutt River (Foto: Norimitsu Onishi/The New York Times)Leonard Casley ao lado de seu próprio busto em Hutt River (Foto: Norimitsu Onishi/The New York Times)
Atrás de Casley, dentro de uma estrutura de tijolo vermelho, como se fosse um terraço, onde uma lagartixa enorme buscou abrigo do forte sol, uma carta laminada e emoldurada das autoridades tributárias da Austrália endereçada a Casley dizia que ele tinha sido "considerado não-residente da Austrália por motivos de tributação". Como proclama a placa junto à carta, "Bem-vindo ao Principado de Hutt River".
Mapa localiza Hutt River (Foto: Arte G1)Mapa localiza Hutt River (Foto: Arte G1)
Com 40 anos, Hutt River é a mais antiga micronação da Austrália, com 7.487 hectares de terras neste pedaço empoeirado e inóspito do oeste da Austrália. Na época de sua criação, insatisfeitos com uma quota imposta pelo governo ao trigo, Casley, agora com 85 anos e ainda líder, pegou sua terra e se separou do restante da Austrália. A aparente secessão deu lugar não apenas a este principado, mas, pela história australiana e um duradouro desdém popular pela autoridade central, também inspirou uma proliferação de novas micronações por todo o país.
Nem o estado, nem o governo federal reconheceram Hutt River como uma nação soberana. No entanto, ao longo das décadas, Casley vem, com esperteza, exercendo leis conhecidas e obscuras - chegando até a declarar guerra à Austrália em certo momento - para manter as autoridades acuadas. Autoridades tributárias não negam a afirmação de Casley, amplamente divulgada na mídia australiana ao longo dos anos, de que ele nunca pagou impostos sobre os negócios conduzidos dentro de Hutt River. Entretanto, Casley reconhece que paga "presentes" anuais ao governo local.
Além das atividades rurais de que participam Casley e os filhos, ele transformou Hutt River numa atração curiosa visitada por milhares de turistas por ano. Ônibus cheios de visitantes, em sua maioria mochileiros jovens, chegam às ruas de pedra que levam à capital do país de Casley, que ele chama de Nain. Ali, no gabinete do governo, visitantes compram vistos e recebem carimbos em seus passaportes por ninguém menos que o próprio Casley - carimbo este de entrada e saída ao mesmo tempo.
Leonard Casley carimba passaporte de visitante (Foto: Norimitsu Onishi/The New York Times)Leonard Casley carimba passaporte de visitante (Foto: Norimitsu Onishi/The New York Times)
"Agora você está legalmente no país", disse Casley, carimbando um dos passaportes. "Você vai embora hoje?", ele disse, enquanto carimbava a saída. Casley reconheceu, mais tarde, que não havia nenhum hotel em Hutt River de qualquer forma. A população do país é de 20 habitantes.
Mesmo assim, ele se apressou em completar, cerca de 13 mil pessoas adquiriram cidadania de Hutt River, que permite dupla cidadania. Alguns moram no exterior e atuam como enviados diplomáticos, obtendo convites internacionais para Casley, como indicam as muitas fotografias, recortes de jornais e cópias de documentos oficiais exibidos numa grande sala que serve como um Ministério das Relações Exteriores. Somente um enfisema o impediu, recentemente, de aceitar convites para visitar a Costa do Marfim e o Benin, explicou Casley.
Ao longo dos anos, Hutt River vem emitindo sua própria moeda e selos, com retratos de Casley e sua esposa, Shirley. Como chefes de um principado, Casley, conhecido formalmente como Sua Majestade Príncipe Leonard I de Hutt, e Shirley Casley, Sua Alteza Real Princesa Shirley de Hutt, também concederam títulos de nobreza a súditos leais. Quantos exatamente, Casley não se lembra.
O príncipe Leonard e a princesa Shirley (Foto: Norimitsu Onishi/The New York Times)O príncipe Leonard e a princesa Shirley (Foto: Norimitsu Onishi/The New York Times)
Nascido em Kalgoorlie, cidade da corrida pelo ouro, Casley abandonou os estudos aos 14 anos e acabou indo trabalhar com despachos em Perth, maior cidade do oeste da Austrália, a cerca de 515 km ao sul daqui. Em seu tempo livre, ele contou que se debruçava sobre livros de contabilidade e aprendeu as regulamentações envolvendo exportações agrícolas, acumulando as habilidades que se tornariam úteis na época da secessão. Ele também serviu na ilha de Borneo durante a Segunda Guerra.
"Ele estava na Força Aérea na época, e fazia cada vez menos o que mandavam", disse Shirley Casley, sugerindo fortemente, com uma risada, que o marido já tinha tendência a dar ordens.
A atenção que Hutt River vem obtendo ao longo dos anos levou ao surgimento de mais de uma dúzia de cópias em toda a Austrália. Os países separatistas - um fenômeno que ficou conhecido como "micronações" muito depois da declaração de independência de Casley - continuam não sendo reconhecidos pela Austrália ou qualquer outro país, muito embora eles sejam abraçados por outras micronações. Mas Casley rejeitou ser associado a outras micro nações. Ele insistiu que Hutt River se qualifica como uma nação real e economicamente independente, ao contrário dos outros.
"Conheço um cara que, quando era mais jovem, declarou separação. Acho que foi com seu quarto que ele o fez. Não vou me comparar a isso."
No entanto, Casley admitiu que a queda da Austrália por figuras rebeldes que apontam o dedo para a autoridade central o permitiu sobreviver por todas essas décadas. O próprio estado da Austrália Ocidental tentou se separar do restante da Austrália na década de 1930; hoje, grande parte da identidade do estado é moldada pela crença de que os vastos recursos naturais da Austrália Ocidental, assim como sua pequena população, poderiam permitir sua independência.
Na Austrália, o fenômeno das micronações tem atraído pesquisa acadêmica.
"Mas muitas autoridades da Austrália Ocidental, algumas de alto escalão, e até no restante do país, ficam felizes em encenar o mito da soberania de Hutt River - frequentando cerimônias, respondendo correspondência, abrindo mão de impostos", disse Judy Lattas, socióloga da Macquarie University que liderou uma conferência sobre micronações em Sydney, no ano passado.
E quanto à sucessão? O filho mais velho de Casley é o próximo da fila de espera pela coroa de príncipe, embora nenhum dos filhos dele tenha demonstrado, pelo menos não em público, a determinação do pai.
"Meus filhos conhecem bem tudo isso", disse Casley. "Algum deles pode ser melhor que eu. Nenhum de nós é insubstituível. O mundo não para."

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