BLOG DO DIA - Retratos e Relatos - Alemanha

Quem de nós, imigrantes, em algum momento não se sentiu um ET na terra dos outros, ou por causa da cultura, ou principalmente por causa do idioma. Alguns tiveram facilidade em aprender, outros (como eu) mais dificuldade, mas que nunca desistiram. Quem nunca se sentiu deslocado? Lendo o post feio pela Maira que está morando e corajosamente fazendo um curso de MBA lá, entendi perfeitamente o que ela passou em um específico dia de sua vida. Quer saber como foi, leia aqui embaixo, já que gentilmente ela me cedeu a honra de publicar o seu post aqui, neste "humirde" blog, rs.

Agora sao 14:15 horas da tarde aqui na Alemanha e eu deveria ainda estar na Uni, mas, adivinhem, nao estou. Fui, aguentei a aula de Direito até onde pude e, após passar do meu limite, decidi vir embora sem peso na consciência, mas com uma dor intensa no coracao.

Por quê? Porque todos os dias tento suportar o fato de nao entender 100% do que é dito nas aulas do meu MBA. Sim, até agora consegui passar em todas matérias e isso, se depender da minha forca de vontade nata, nao vai mudar. Mas tem dias (como hoje) que eu lembro que sou humana e nao a mulher maravilha. Chega um momento após 5 horas ouvindo algo que você simplesmente nao compreende, que você simplesmente desiste. Sao horas sentada ali com cara de quem tá com diarréia; vendo todo mundo rir de algo que você nao faz a menor idéia do que é; vendo todo mundo procurando alguma informacao no material didático e que você também nao faz a menor idéia o que é que eles tanto procuram; vendo que no trabalho em grupo sua colega do lado simplesmente vira às costas para você (detalhe, você está no grupo dela), pois sabe que você precisa de no mínimo mais 15 minutos pra conseguir entender as palavras mais básicas pra ela, ou seja, com certeza você nao vai saber a resposta que o grupo precisa dar; sao horas onde você se pergunta a cada minuto: “O que é que eu ainda estou fazendo sentada aqui?”. Pois bem, hoje depois de 5 horas vivendo isso pela enésima vez, decidi espontaneamente levantar e ir embora. Segunda-feira vou passar pela mesma coisa, mas pelo menos vou ter 3 dias pra traduzir todas palavras que preciso traduzir para, pelo menos, entender porque estarei sentada lá de novo.

E quando esse sentimento fica como hoje à flor da pele (sim, porque existir ele existe todos os dias desde que comecei esse MBA), sinto falta dela: da língua portuguesa. Sinto falta de ouvir, de ler e de escrever em português mais intensamente. Sinto falta da musicalidade. Sinto falta de me expressar na minha língua materna. Sinto falta de ler e só ter que entender o conteúdo, nao os significados. Sinto falta até mesmo das minhas aulas de português com a Profa. Nancy e depois com a Profa. Marleide. Ai que saudades! Meu Deus que saudades de ser compreendida e compreender tudo todos os dias! (pelo menos no que diz respeito à língua…rs)

Sendo assim, como nao podia deixar de ser, decidi saber o que dizem os poetas sobre nossa língua portuguesa. Acreditem, quando li a análise do poema abaixo “Língua Portuguesa” de Olavo Bilac, chorei e, dá um desconto, ainda estou chorando (se tivesse lido só o poema, sem a análise, teria chorado por nao entender nem mesmo português…rs). Mas me pergunto: “Será que se eu nao estivesse vivendo esse “conflito” linguístico, eu choraria lendo um poema que fala sobre a língua portuguesa?”. Acho que nao. Por isso, mais uma vez, agradeco à Deus por me por em mais uma situacao transformadora e enriquecedora, mesmo que extremamente difícil e desgastante. Viver é ajustar nossas lentes constantemente, buscando sempre novos pontos de vista.

Nossa língua portuguesa é MARAVILHOSA. Acreditem! E nao é só porque eu sou brasileira nao, muitas pessoas de outras nacionalidades que me ouviram falando português, disseram que é delicioso ouvir a gente falando português. Ou seja, falem bem ou mal dos “invasores” portugueses, mas ninguém pode negar que esse legado foi um presente. Um presente que nós, brasileiros, otimizamos e embelezamos. (((-:

Saudades de você minha querida e insubstituível “Língua Portuguesa”!!!! )))-:

“LÍNGUA PORTUGUESA” Olavo Bilac (1865 – 1918)

Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela…

Amote assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela
E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

Em que da voz materna ouvi: “meu filho!”
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!

Análise do poema por Paula Perin dos Santos:

“No poema Língua Portuguesa, o autor parnasiano Olavo Bilac faz uma abordagem sobre o histórico da língua portuguesa, tema já tratado por Camões. Este poema inspirou outras abordagens, como o poema “Língua”, de Gilberto Mendonça e “Língua Portuguesa”, de Caetano Veloso.

Esta história é contada em catorze versos, distribuídos em dois quartetos e dois tercetos – um soneto – seguindo as normas clássicas da pontuação e da rima.

Partindo para uma análise semântica do texto literário, observa-se que o poeta, com a metáfora “Última flor do Lácio, inculta e bela”, refere-se ao fato de que a língua portuguesa ter sido a última língua neolatina formada a partir do latim vulgar – falado pelos soldados da região italiana do Lácio.

No segundo verso, há um paradoxo: “És a um tempo, esplendor e sepultura”. “Esplendor”, porque uma nova língua estava ascendendo, dando continuidade ao latim. “Sepultura” porque, a partir do momento em que a língua portuguesa vai sendo usada e se expandindo, o latim vai caindo em desuso, “morrendo”.

No terceiro e quarto verso, “Ouro nativo, que na ganga impura / A bruta mina entre os cascalhos vela”, o poeta exalta a língua que ainda não foi lapidada pela fala, em comparação às outras também formadas a partir do latim.

O poeta enfatiza a beleza da língua em suas diversas expressões: oratórias, canções de ninar, emoções, orações e louvores: “Amo-te assim, desconhecida e obscura,/ Tuba de alto clangor, lira singela”. Ao fazer uso da expressão “O teu aroma/ de virgens cegas e oceano largo”, o autor aponta a relação subjetiva entre o idioma novo, recém-criado, e o “cheiro agradável das virgens selvas”, caracterizando as florestas brasileiras ainda não exploradas pelo homem branco. Ele manifesta a maneira pela qual a língua foi trazida ao Brasil – através do oceano, numa longa viagem de caravela – quando encerra o segundo verso do terceto.

Ainda expressando o seu amor pelo idioma, agora através de um vocativo, “Amo-te, ó rude e doloroso idioma”, Olavo Bilac alude ao fato de que o idioma ainda precisava ser moldado e, impor essa língua a outros povos não era um tarefa fácil, pois implicou em destruir a cultura de outros povos.

No último terceto, para finalizar, quando o autor diz: “Em que da voz materna ouvi: “meu filho!/ E em que Camões chorou, no exílio amargo/ O gênio sem ventura e o amor sem brilho”, ele utiliza uma expressão fora da norma (“meu filho”) e refere-se a Camões, quem consolidou a língua portuguesa no seu célebre livro “Os Lusíadas”, uma epopéia que conta os feitos grandiosos dos portugueses durante as “grandes navegações”, produzida quando esteve exilado, aos 17 anos, nas colônias portuguesas da África e da Ásia. Desce exílio, nasceu “Os Lusíadas”, uma das oitavas epopéias do mundo.

Fonte: http://www.infoescola.com/literatura/analise-do-poema-lingua-portuguesa/

E você? já se sentiu assim também, conta para gente.

12 BRASILEIROS:

Moni disse...

Oi Cris, vim retribuir a visita,que blog legal, pena que eu agora estou sem tempo, voltarei logo para lê-lo com calma.

Bjos

anlene gomes disse...

É Cristiane deve ser dureza não entender nada, mas também acho, e isso é muito pessoal, que muitas vezes menosprezamos a importância de certos passos que devemos dar antes de viver fora.
Sinto muita falta do "brasileiro" e também sinto que cada ano que passo na espanha vou perdendo alguma coisa. É triste, mas é verdade!
Bonito blog! Obrigada pela visita e pelo comentário! Bj

Edelize disse...

Cristiane, obrigada pela visita. Me identifiquei tanto com o nome do seu blog :-)

Eu não sinto saudades do português pois falo em casa com o maridex e ele me mantém na linha (falando correto sem misturar), mas eu perco a musicalidade da nossa língua (logo recupero quando vou ao Brasil), mas me lembro que logo que cheguei aqui passei por momentos dífíceis e engraçados com a nova língua e nessas horas senti muita falta de ser entendida. Bjocas!

Cantodomeucordel disse...

Realmente não é fácil adaptar-se a outra cultura e, ainda mais, a outro idioma. Quando fui à Galícia, na Espanha, parecia-me estar num universo totalmente estranho por causa da maneira peculiar como eles falam.

Gostei muito do seu blog, parabéns!

Conheça também meu outro blog:
http://gilbamar-poesiasecronicas.blogspot.com/

Zilma disse...

Oi, Cristiane!

Antes de tudo, muita obrigada por ter me incluído nos seus links.
O tema da postagem - e como ele foi retratado -está sensacional. O idioma (ou a falta dele) é algo que nos toca bem de perto, principalmente se o ouvimos apenas espaçadamente). "A língua é nossa pátria", como já disse Caetano, é um fato inexorável. Ele, aliás, inspirou-se noutra frase célebre de Fernando Pessoa, que afirmou: "A língua é minha pátria e minha pátria é a língua portuguesa". É isso aí. Bjs.

Ciça Donner disse...

Maninha realmente, as coisas nao sao faceis. Dá vontade de simplesmente sumir na face da terra. Mas gracas a Deus isso nao aconteceu pq a rapadura pode ser dura mas deixa um docinho bom na boca!!!

Cristiane A. Fetter disse...

Moni, que legal, volte sempre viu?
bjks

Cristiane A. Fetter disse...

Oi Anlene, nem sempre a vida nos deixa opções. Meu caso é um exemplo. Nunca pensamos em nos mudar para outros país, mas derepente recebemos o convite da empresa em que meu marido trabalhava. Ele fala 7 linguas e eu não.
As oportunidades aparecem assim, não é verdade?
bjks

Cristiane A. Fetter disse...

Edelize, você tocou num ponto importantíssimo, a musicalidade da nossa lingua.
Falamos português em casa também, primeiro pq somos brasileiros e segundo para o filho não esquecer a lingua pátria.
Mas a cadência e até mesmo algumas expressões estão se perdendo.
bjks

Cristiane A. Fetter disse...

gilbamar é verdade, as vezes nos sentimos em outro planeta, rs.
bjks

Cristiane A. Fetter disse...

Zilma, concordo em gênero, número e grau.
bjks

Cristiane A. Fetter disse...

Ciça, as vezes eu me sinto uma aveztruz, só fico com vontade de enfiar a cabeça dentro da terra, rs.
bjks